quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

O Carnaval à mesa em Estarreja

Aquilo a que hoje chamamos de Carnaval tem na tradição popular o nome de Entrudo. É um período de excessos, herdeiro de algumas tradições pagãs, excessos esses que se verificam também à mesa. É que estando para iniciar-se o período da Quaresma, o Entrudo é o momento de tirar a barriga de misérias, com a carne que nas semanas seguintes será proibida. Para além disso, este foi nalguns casos um dos momentos do ano em que os antigos pagavam tributos. Por exemplo em notícia de 1746, de Fermelã, um tributo eclesiástico incluía o pagamento de cordeiros nesta altura.

A mesa do Entrudo havia portanto ser farta de carne. Para muitos era o buscar à capoeira o melhor que lá houvesse, para reunir a família no domingo gordo. Mais interessante era o uso que antigamente se fazia da carne de porco, de que os mais velhos se devem lembrar pelo menos em Avanca, Bunheiro e nas Quintas da Torreira. Refiro-me à tradição do “caldinho do Entrudo”. Na quinta-feira gorda (a primeira antes do Entrudo), e nalguns casos também na quinta-feira magra (a segunda antes do Entrudo), as crianças e alguns adultos de espírito mais folgazão andavam em grupos a pedir comida pelas casas, em particular carne. Via-se assim crianças com uma sacola pedindo carne aos vizinhos, para o dia do “caldinho”. Com o que se juntava de pedir pelas casas fazia-se o tal “caldinho”, que nesse dia era partilhado e comido em conjunto num ambiente de alegria. A panela do caldo costumava levar os “tornelhos”, as orelhas e as canas do porco.

Faltam aqui as guloseimas, que não poderiam ficar de fora num momento festivo. No Entrudo as que se comiam eram as filhoses (por alguns chamadas filhós), uma massa de farinha, ovos, açúcar, sal e água, que se leva a fritar, e depois de absorver o óleo em papel de cozinha polvilha-se com açúcar a canela.

Há ainda notícia de algumas crianças comerem nesta época os razudos, um pão de milho semelhante ao bolo, com 7 ou 8 cm de diâmetro. Mas este é o Carnaval que já não é, foi.

In "O Carnaval à mesa em Estarreja”, O Jornal de Estarreja, n.º 4600, 17.2.2012, p. 2

Sem comentários:

Enviar um comentário