domingo, 15 de dezembro de 2013

Sabores de Natal em Estarreja


Cada região portuguesa tem as suas tradições culinárias, que variam consoante os vários momentos altos do ano, e de terra para terra. A região de Estarreja possui também tradições gastronómicas, que definem uma boa parte da identidade do povo que aqui vive. Há alimentos que se comem quase só no S. Gonçalo (no início do ano), no Carnaval, na Páscoa, nos santos populares, ou no Natal. A cada época associamos determinados sabores, sem os quais a data celebrada perde grande parte do seu valor. Nos últimos anos, ou décadas, a televisão e outros meios de comunicação aproximaram mais o modo de viver de todas as pessoas, contribuindo para uma crescente identidade comum, e o esbater das diferenças regionais, que não nos separam necessariamente, e poderão mesmo ser um trunfo para o turismo e outros domínios.

O Natal é por excelência um momento com paladares próprios, e que como acima se disse variam de região para região. O prato característico da noite de consoadas em Estarreja é o mais comum de Portugal: o bacalhau cozido com batatas e couves ou grelos. A sobremesa pode constar de castanhas, arroz doce, ou por vezes sopa doce. Mas isto não é a regra. As guloseimas rainhas do típico Natal de outros tempos, em Estarreja, são principalmente os bilharacos (feitos de abóbora, ovos, farinha, manteiga, açúcar e canela), as rabanadas (pão, leite, ovos, açucar e canela) e as filhoses ou filhós (farinha, ovos, açúcar e canela). Todos os três doces da época levam ovos, à boa maneira portuguesa, e todos são polvilhados com açúcar e canela depois de prontos, que misturadas ajudam a distinguir a doçaria natalícia.

Ao pensar nos bilharacos vem à lembrança que a abóbora, abundante nos quintais da região, ainda está longe de atingir todo o seu potencial gastronómico. Substitui com algumas vantagens a batata na sopa, é ingrediente da interessante variedade da broa de abóbora, e participa na feitura de alguns doces. Outros destinos lhe poderiam talvez ser dados.

O bacalhau cozido, e o cheiro dos bilharacos, das rabanadas e das filhoses, a todos ou quase todos trazem e amplificam a memória de natais passados e tempos de infância. A abundância de sabores que são estranhos à tradição local e nacional lentamente vai enterrando esse passado genuinamente nosso. Recuperar algumas das tradições passadas, sem necessariamente afastar as comodidades do presente, poderá ser um mercado da saudade e da identidade. Por outro lado pode significar uma poupança do país nas importações, e investimento nas exportações (por via do turismo), importantes nos dias em que vivemos.

In O Jornal de Estarreja, n.º 4591, 9.12.2011, p. 2

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